COBRAPOL soma-se a outras entidades no repúdio à ‘Investigação Defensiva’
“A proposta só vai beneficiar as organizações criminosas e os bandidos ricos”, diz o manifesto
Entidades representativas das forças de segurança pública de todo país, entre as quais a COBRAPOL, divulgou manifesto repudiando proposta apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ao Projeto de Lei 8.045/2010, hoje em tramitação na Câmara dos Deputados, que trata da reforma do Código de Processo Penal. A proposta permite aos advogados a prática de investigação paralela para ajudar seus clientes.
A sugestão da OAB, conhecida como Investigação Defensiva, foi acolhida pelo relator do PL, deputado João Campos de Araújo (Republicanos/GO). “Investigação Defensiva é prestigiar o criminoso, em especial os ricos e as organizações criminosas em detrimento da vítima e de toda a sociedade”, resume a nota, que encerra cum uma ponderação: “Recomendamos a supressão integral do instituto da investigação defensiva, já que evidenciada a sua inconstitucionalidade e/ou ilegalidade”.
A manifestação conta com o apoio declarado, também, dos deputados federais Capitão Augusto, Ubiratan Sanderson e Subtenente Gonzaga, que resume: “Quem tem dinheiro poderá pagar por uma investigação paralela”.
A ‘Investigação Defensiva’ é um mecanismo que pode ser utilizado pelo advogado com vistas a buscar provas que venham a inocentar ou atenuar a pena do seu cliente. Neste caso, o advogado tem o dever de investigar o caso que lhe é confiado e buscar provas, inclusive periciais, que venham a beneficiar a defesa do seu cliente. Pela proposta da OAB, os advogados passariam a ter o mesmo direito de investigar que tem o Estado, podendo produzir provas pericias e ouvir testemunhas e investigados.
COBRAPOL – O presidente da COBRAPOL, André Luiz Gutierrez, que também assina a nota, disse que “além de prestigiar os bandidos ricos, ou seja, aqueles que têm condições de contratar os mais poderosos escritórios de advocacia, a proposta, infelizmente acolhida pelo relator do CPP na Câmara dos Deputados, conspira contra o atual sistema público de investigação que está sob a responsabilidade das polícias civis”.
O dirigente acrescentou que “se o objetivo do texto sugerido pela OAB é reforçar ou modernizar os instrumentos de investigação criminal, que se faça pelo caminho do fortalecimento dos atuais mecanismos existentes, especialmente com a valorização dos profissionais da segurança pública e mais investimentos em tecnologia investigativa”.
Conheça o Manifesto das entidades na íntegra:
MANIFESTO CONJUNTO PELA SUPRESSÃO DE TODOS OS DISPOSITIVOS SOBRE INVSTIGAÇÃO DEFENSIVA DO PROJETO DO NOVO CPP
“Investigação Defensiva” é prestigiar o criminoso, em especial os ricos e as organizações criminosas em detrimento da vítima e de toda a sociedade.
O presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, instituída nos termos do ato da mesa da Câmara dos Deputados de nº 69 de 2005, entidade que congrega mais de trezentos parlamentares federais, os parlamentares signatários deste manifesto, e as entidades representativas em âmbito nacional do segmento de profissionais de segurança pública, vêm se manifestar contra o instituto da chamada “Investigação Defensiva”.
O Projeto do Código de Processo Penal traz uma preocupante inovação na ordem jurídica brasileira ao regular a chamada “investigação defensiva” e legalmente possibilitar a colheita de provas diretamente pela defesa à revelia do Estado, sem controle, sem responsabilidade e sem a obrigação de entregar a verdade ao juiz.
Nessa linha, a investigação defensiva ofende o princípio da oficialidade, já que a atividade investigativa deve ser feita por órgãos oficiais estatais que não pertencem a nenhum dos envolvidos, nem a vítima e nem ao investigado, mas permite que ambos participem na produção de provas, quer seja diretamente ou por meio de seu representante legal, colaborando com as autoridade públicas.
Quando a investigação é feita exclusivamente pela defesa, sem que igual direito seja dado também para a vítima, temos um desequilíbrio dos direitos dos envolvidos, o que chamam modernamente de “desigualdade de armas”.
Uma investigação, com poderes do direito público – sem a participação de órgãos oficiais –, estimula a produção de todo tipo de prova, também conhecidas como “dossiês”, em especial aquelas sem relação com uma investigação em andamento ou de caráter meramente vingativo e direcionado a um desafeto.
De forma preocupante, a investigação defensiva não possui qualquer tipo de controle externo feito por órgãos oficiais, de modo que tal investigação, por mais que em certos casos se apresente ilegal ou mesmo violadora de direitos fundamentais, pode nunca levar à responsabilização daquele que a preside, ao argumento de que a sua publicidade é uma mera faculdade da defesa.
Observe que, ao argumento de potencializar a ampla defesa, o que já existe, pois o investigado pode requer a autoridade policial a produção de provas, na verdade, a investigação defensiva evidencia um desequilíbrio da defesa técnica no Brasil. Isso ocorre porque existe um nítido favorecimento de réus de grande poder econômico, capazes de efetivamente arcar com os custos de tal investigação.
Com isso, viola-se a imparcialidade, a impessoalidade, a moralidade e a isenção que se espera de um sistema de investigação criminal responsável e sem direcionamentos por algum dos interessados no caso. Por mais que o sistema atual tenha as suas falhas, não se deve fragilizá-lo ainda mais com institutos que nitidamente transgridam os pressupostos investigativos apresentados, previstos, inclusive, em documentos internacionais.
A título exemplificativo, o Manual de Formação em Direitos Humanos para as Forças Policiais (ONU, p. 56-57) institui que, durante as investigações, audição de testemunhas, vítimas e suspeitos, entre outras atividades investigativas:
● A informação sensível deverá ser sempre tratada com cuidado e o seu carácter confidencial respeitado em todas as ocasiões;
● As atividades de investigação deverão ser conduzidas em conformidade com a lei e apenas quando devidamente justificadas; e
● Não serão permitidas atividades de investigação arbitrárias ou indevidamente intrusivas.
Como colocado, a investigação defensiva potencializa a violação dessas diretrizes da ONU e de princípios relativos ao funcionamento da investigação criminal. Pior, a investigação defensiva não possui qualquer tipo de controle e nem mesmo alguma estrutura base de accountabilty, o que evidencia a ausência de mecanismos que permitam a prestação de contas pela defesa e a responsabilização das atividades daí decorrentes.
Por fim, deve-se chamar a atenção para outro potencial problema. A contratação de investigadores no âmbito de uma investigação defensiva pode desaguar na utilização do período de folga de policiais concursados, gerando problemas de ordem disciplinares e potenciais crimes, como a violação de sigilo funcional e a advocacia administrativa.
De todo o exposto, recomendamos a supressão integral do instituto da investigação defensiva, já que evidenciada a sua inconstitucionalidade e/ou ilegalidade.
Assinam a nota
Deputado Federal Capitão Augusto – Presidente da Frente Parlamentar de Segurança Pública
Deputado Federal Ubiratan Sanderson
Deputado Federal Subtenente Gonzaga
ANASPRA – Associação Nacional das Praças
ANERMB – Associação Nacional de Entidades Representativas de Policiais Militares, Bombeiros Militares e Pensionistas do Brasil
ADEPOL DO BRASIL – Associação dos Delegados de Polícia do Brasil
COBRAPOL – Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis ABC – Associação Brasileira de Criminalística
APCF – Associação dos Peritos Criminais Federais
FENEME – Federação Nacional das Entidades Militares Estaduais FENAPEF – Federação Nacional dos Policiais Federais
FENAPRF – Federação Nacional dos Policiais Federais
AMEBRASIL – Associação Nacional dos Militares Estaduais do Brasil